sábado, 13 de novembro de 2010

Crônicas Omne 1x03

Capítulo 3: A cura


“Ainda que eu ande no vale das sombras, não temerei mal nenhum, pois o senhor está comigo(...)”
Bíblia Salmo 23

     Lá estava Gabriel, deitado em sua cama, cada vez mais depressivo, lembra-se do sonho em que podia andar, começou a valorizar aqueles que conseguem, queria acabar com aquele sofrimento, mas nem seu próprio corpo lhe dava essa chance, o tempo era uma tortura e cada vez mais desejava não existir. Vishnu o observava de perto, sabia que sua próxima ação mudará o rumo dele, e ainda que Sarah o tivesse pedido para cobrir a verdade, será inevitável sua revelação.
     Os três subordinados de Huncamé, Kalu, Naton e Jean, começaram a sofrer os efeitos da falta de ectoplasma, energia essencial para manter materializado os corpos do plano astral, sua escassez leva a uma fadiga extrema e grande dificuldade respiratória, solicitaram a seu mestre uma dose da energia, que para os seres de baixa densidade trazia sensações prazerosas, tal qual as drogas.
“Vocês precisam aprender a racionar o ectoplasma em seus próprios corpos.”
“Mestre, por favor, nos ajude, a dor está se tornando insuportável.”
“A dor é passageira, após o ectoplasma ser esgotado seus corpos materializados são dissolvidos, retornando para o plano astral.”
     Huncamé materializou em sua mão o que parecia ser uma injeção, em seu interior ectoplasma, de aspecto entre liquido e gasoso, com tonalidade cinza, ejetando a energia em seus subordinados, ao entrar no corpo, podia ser visto percorrendo veias energéticas chamadas nadis, semelhantes as veias sanguíneas, a diferença é que nos nadis percorrem a energia vital, chamada de chi ou ki, o ectoplasma mantém denso esta energia, portanto, materializado.
“Nossas reservas estão ficando escassas, arranjem um meio de encontrarem mais.”
“Sim mestre.”
     Gabriel recebe visitas em seu quarto, seis colegas de escola, não imaginava que tantas pessoas se preocupavam com ele.
“Olá Gabriel, você não apareceu nos últimos dias, ficamos preocupados, então ligamos para sua tia e soubemos o que aconteceu, viemos lhe dar um apoio.”
“Preocupados?”
“Não fique assim, mais pessoas queriam vir, a professora também, nós gostávamos quando você explicava o sobrenatural.”
“Como você está Gabriel?”
“Não pergunte isso a ele Carlos.”
“Estou levando, mas ficar aqui deitado vinte e quatro horas por dia é entedioso, tudo o que posso fazer é assistir TV e dormir.”
“A escola é entediosa também, não é mesmo?”
     Gabriel deu um leve sorriso, estava se sentindo confortável com aquelas pessoas a sua volta.
“Nós vamos fazer a brincadeira do copo esta noite no parque, queríamos que você estivesse lá.”
“É, também queria...a brincadeira do copo?”
“Como você nos ensinou.”
“É um tanto perigosa, tomem cuidado.”
“Teremos.”
     Quando chegou a noite, os seis colegas de Gabriel estavam reunidos em um parque na cidade, se aproveitaram do momento que não tinha mais ninguém, carregavam a tábua Ouija, uma tábua onde está distribuída letras em ordem alfabética e os números de zero a nove. Sentaram ao redor da tábua, colocaram o copo ao centro onde cada um pudesse tocar no topo com seus dedos.
“Deixem os dedos leves, o que precisamos é conduzir a força da energia do espírito, não a nossa própria.
     Enquanto isso, os servos de Huncamé partiram da casa.
“Está uma ótima noite para assustar criancinhas.”
“Kalu, nosso objetivo é obter ectoplasma.”
“Eu sei, eu sei, mas sempre prefiro obtê-lo de modo divertido, se me entende...”
“Comecem procurando por esquinas, depois parques e bordéis”
No parque, iniciaram o ritual para a comunicação com algum espírito.
“Ó espírito, você está aí?”
     Passaram trinta segundos e nada aconteceu, voltaram a repetir a frase, ainda assim nenhum movimento, ocasionalmente, Kalu, um dos servos de Huncamé passou pelo parque e notou a prática do grupo, ele estava desmaterializado, portanto não seria visto ou ouvido, aproximou-se.
“Ora ora, parece que temos algo divertido aqui, vou chamar os outros”
     O copo deslocou para a palavra sim na tábua, os seis ficaram espantados.
“Funciona..”
“Certo, vamos manter a calma, ó espírito, quem é você?”
     A palavra formada foi: um amigo.
“Um amigo, não estamos tão mal assim.”
“E agora?”
     Durante o ritual Naton e Jean inseriram um tipo de cano finíssimo na nuca de cada um enquanto Kalu movimentava o copo com um pouco de ectoplasma necerrário, o cano tem como propósito retirar a própria energia, sendo drenado para um tipo de tonel que foi formado ali.
“Pessoal, estou me sentindo meio cansada”
“Calma, amigo, nós o conhecemos?”
     A palavra formada foi: sim.
“Poderia dizer quem?”
     A palavra formada foi: morte.
“Morte? Já chega, isso é brincadeira de mal gosto, vou me retirar”
     Quem ia se retirar desmaiou, tendo convulsões, entraram em pânico, não conheciam os procedimentos.
“O que está acontecendo?”
“Alguém faz alguma coisa!”
“Meu deus...”
“Chamem uma ambulância, agora!”
     O tonel de ectoplasma foi completado, após isto, voltaram para a casa abandonada que possuíram para organizarem suas ações.
     Gabriel volta a sonhar, mas desta vez em um local diferentes do último que teve, como estava sem lucidez, não notou que estava sem a paralisia corporal. O lugar parecia um arquipélago, em umas das ilhas pequenas havia ruínas que lembravam colunas gregas, em mármore puro, gramíneas cresciam entre elas, a atmosfera era leve e silenciosa, o mar calmo, muitas árvores pareciam centenárias, ninguém vinha há muito tempo, ao andar até um círculo entre aquelas colunas encontra Vishnu, escorado em um totem de origem indígena, um tanto rupestre, mas condecorado com diversos símbolos, abaixo a lua, acima o sol, e entre eles, faces de pessoas.
“Passaram por aqui muitas culturas do mundo, todas deixando sua marca.”
“Que lugar é esse?”
“Um templo, por assim dizer, onde civilizações antigas compartilhavam seu conhecimento acerca do universo, infelizmente foi abandonado desde que a curiosidade pelo saber foi tomada por uma era de escuridão, me diga Gabriel, por que saiu de casa?”
“Fui procurar Sarah e...deu tudo errado.”
“Tem certeza quanto a isso? Era realmente Sarah quem você estava procurando? Pode mentir para todos, exceto para si mesmo.”
“Eu não quero aquele tipo de vida...”
“O que você quer então?”
“Eu não sei...sinto como se tivesse algo escondido, que esteja além da compreensão humana, gostaria tanto de alcançar...como procurar por algo que você não conhece?”
“É uma boa pergunta. O que você faria se tivesse uma pista?”
“Iria continuar perseguindo seja o que estiver procurando.”
Vishnu aproxima de Gabriel, toca em sua cabeça, sussurrando em seus ouvidos.
“Ainda há tempo, tem meu respeito.”
     Gabriel acorda, já não se lembrara do sonho que teve, como um reflexo leva a mão até a testa e então percebe, estava se movendo, tanto os braços quanto as pernas, não era mais tetraplégico, seu espanto o fez levantar, estava andando, embora não se lembrava do sonho, acabava por ficar em seu inconsciente, a pista que tanto queria, ao invés de sorrir, tomou uma atitude.
“Tenho que descobrir o que está acontecendo.”

3 comentários:

  1. Ta bom demais, parabens!!!


    Paz e Luz.

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  2. Emocionante,ta cada vez melhor.Não vejo a hora do proximo capitulo.
    Ivana

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  3. Muito bom to paralisado a historia realmente faz agente grudar nela Mt bom

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